Sem demarcação, não há democracia. Sem respeito, não há democracia

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Por Israel Vancouver

Indígenas da Terra Indígena da Barra do Mundaú (CE),  no 19° ATL

O dia 28 de abril de 2023 foi marcado pela demarcação de seis terras indígenas, dentre elas, a da Barra do Mundaú, do povo Tremembé, localizada no distrito de Marinheiros, no município de Itapipoca, no litoral Oeste do Ceará. Luís Inácio Lula da Silva, presidente da república, Sônia Guajajara, ministra dos povos originários e Joenia Wapichana, presidenta da Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai), foram algumas personalidades que participaram da cerimônia de encerramento do 19º Acampamento Terra Livre (ATL), que ocorreu em Brasília, entre os dias 24 e 28 de Abril de 2023, com o tema central “O futuro indígena é hoje. Sem demarcação, não há democracia”.

Em 2022, o então candidato à presidência da república Luís Inácio Lula da Silva esteve presente no 18° ATL para firmar compromisso com os direitos dos povos originários. Com a vitória de Lula nas eleições, foi esse compromisso cobrado durante toda a programação do evento. Os milhares de indígenas que estiveram presentes deram visibilidade à emergência climática, exigiram a demarcação de suas terras e protestaram contra projetos que ameaçam a existência indígena no Brasil. A ocasião terminou com a homologação efetiva de seis terras indígenas, representando esperança em dias futuros e o reforço da nossa democracia.

Suyane Fernandes, coordenadora de captação de recursos da organização, que esteve presente nesse dia histórico, deu destaque a algumas conquistas do evento: “Além da assinatura das 6 terras indígenas, Lula aprovou o plano nacional de gestão territorial dos povos indígenas e assinou investimentos para a recuperação do território Yanomami, massacrado pelo garimpo”, ela completa dizendo: “Esse ATL, além de enfatizar a organização e luta indígena permanente pela terra, reflete a expectativa sobre um novo tempo que se instaura em nosso país: um tempo de esperançar”.

Sônia Guajajara, Luiz Inácio Lula da Silva e Joenia Wapichana durante o encerramento do Acampamento Terra Livre. Foto: Reprodução/Marcelo Camargo/Agência Brasil

Vale destacar que o CETRA tem, desde sua origem, uma história de apoio às lutas indígenas, acompanhando e prestando assistência técnica e jurídica à Terra Indígena da Barra do Mundaú desde 2016, com o projeto Ação Tremembé. O objetivo do Projeto foi fortalecer a capacidade de articulação, diálogo, visibilidade e incidência política dos indígenas para proteger seus direitos humanos e suas organizações. Além disso, o projeto ofereceu apoio financeiro às ações de incidência política do Conselho junto às autoridades e a órgãos públicos, articulação com outras organizações indígenas, participação em assembleias, eventos e mobilizações indígenas e assessoria jurídica para o acompanhamento do processo de demarcação da terra indígena.

Em 2018, como resultado da ação, um termo de cooperação técnica foi assinado entre a Funai e a Secretaria do Desenvolvimento Agrário (SDA), dando início ao processo de demarcação física, com a materialização dos marcos e georreferenciamento da terra. A área tem 3.511,4 hectares, onde estão quatro aldeias: São José, Buriti de Baixo, Buriti do Meio e Munguba, com cerca de 150 famílias. 

A luta pela terra é constante. O dia 28 de abril representou o início do fim de muita opressão já vivida pelos povos que primeiro habitaram as terras brasileiras. Sobre esse dia, Ezequiel Tremembé afirma que “é um momento histórico para o Brasil, principalmente na luta dos povos indígenas [..]. Esse ano foi muito importante nessa construção e reconstrução do país, no sentido de potencializar e reafirmar ao Governo Federal que o movimento indígena o elegeu e somou em sua eleição e, a partir dali, reivindicar e cobrar pacificamente as ações voltadas aos povos indígenas, principalmente a demarcação de suas terras”, e, sobre a demarcação, declara: “Isso é uma alegria, uma conquista! […] O acampamento Terra Livre é mais especial a cada ano que se constrói”. 

Representantes do CETRA no 19° ATL, no dia 28/04/2023, em Brasília

Ainda sobre o sentimento de alívio dos beneficiados com a demarcação, Erbene Tremembé, liderança do povo indígena Tremembé da Barra do Mundaú, em Itapipoca (CE), depõe: “Chorei muito, de tanta alegria, por tanta luta que tivemos. Há vinte anos que lutamos por esse momento da nossa terra ser homologada. Foi uma coisa linda, maravilhosa para a gente, a emoção que nós sentimos nesse dia, de tanta alegria em saber que nossa terra foi homologada depois que passamos por muitos conflitos”. 

Conflitos com invasores, com empresas, com garimpeiros, continuarão a existir. É nisso que se faz necessário nosso apoio, nossa resistência. Sem demarcação, não há democracia! Sem respeito, não há democracia. De conquista em conquista, vamos respirando mais aliviados, mas é necessário lembrar que nosso esperançar é construído diariamente, com luta e esforço constantes.

“Lembrei muito das noites de insônia, dos conflitos que vivemos nessa terra, de tantas coisas que passamos juntos e dos nossos idosos que começaram junto conosco e não estavam no momento para ver, mas eu senti a presença do meu pai e dos idosos que tanto almejavam por aquele momento” – Erbene Tremembé.

Erbene finaliza dizendo: “daqui pra frente, é pensarmos juntos, em coletividade, como vamos nos organizar cada vez mais e no futuro da nossa geração e do nosso povo Tremembé da Barra”. O CETRA compactua com essa ideia. Nossa meta é gerar e promover coletividade, continuar nos apoiando para, juntos, construirmos um país mais justo, livre e verdadeiramente democrático. Seguimos plantando esperança, reforçando que sem respeito, não há democracia.

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