Encontro Diálogos sobre Juventudes e Agroecologia reúne jovens de coletivos e redes em Recife-PE

 

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Encontro Diálogos sobre Juventudes e Agroecologia reúne jovens de coletivos e redes em Recife-PE

Por Áurea Olimpia, comunicadora AS-PTA
Fotos Amanda Sampaio e Gleyciane Teles

O Encontro “Diálogos sobre Juventudes e Agroecologia”, realizado entre os dias 26 e 28 de outubro, em Recife-PE, pela Articulação Nacional de Agroecologia (ANA) reuniu na capital pernambucana mais de 150 jovens de diversas partes do país. O evento teve como objetivos promover a troca de experiências e conhecimentos entre as juventudes, visando o fortalecimento das identidades camponesas; conhecer os coletivos e redes de juventudes que atuam na perspectiva da agroecologia; e fortalecer as juventudes em torno da pauta da agroecologia e da criação de coletivos e redes de juventude com incidência no nível local, regional e nacional.

A abertura do encontro se deu com os participantes em roda cantando as palavras “Oguntê” e “Godurê”, pertencentes ao tronco linguístico originário “Macro jê”, dos povos tradicionais da região Norte, que significam “bem-vindo” e “que bom que você está aqui”. Em seguida, os participantes ajudaram a montar uma linha do tempo sob a perspectiva da organização da juventude, com momentos marcantes como o II e o III Encontro Nacional de Agroecologia (ENA), a Caravana Agroecológica e Cultural preparatória para o III ENA e a Cúpula dos Povos, evento paralelo à Rio +20.

Após esse momento, os participantes se dividiram em grupos com a tarefa de levantar os fatores de atração e de repulsão da juventude no campo. As dificuldades no acesso à terra e a à água, a estiagem prolongada, as grandes obras, o agronegócio, a violência no campo, o machismo, a educação descontextualizada e o preconceito contra as populações do campo foram os pontos que apareceram com mais força como limitantes à permanência do jovem na zona rural. Já as políticas públicas de acesso à água, os fundos rotativos solidários, os movimentos sociais, a agroecologia e a organização política da juventude foram lembrados como fatores que contribuem para a permanência do jovem no campo.

“Onde eu moro tem bastante água e terra, mas o que falta é a cultura do plantar e do colher, isso está se perdendo. As pessoas só acreditam no que vem rápido. Vendem uma caixa de caju a oito reais, enquanto poderiam vender a de castanha a setenta reais. As pessoas não acreditam no seu próprio trabalho. Quando terminei meus estudos, eu não tinha noção, mas quando comecei a participar dos encontros, abri a minha mente, para crescer a partir da minha comunidade. Hoje eu faço engenharia ambiental e tento passar para os outros jovens da minha comunidade o que aprendo”, disse a jovem Deiciane Braga, de 23 anos, moradora do Assentamento Batalha, município de Trairi, Ceará.

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No período da tarde do primeiro dia, foram apresentadas três experiências de juventude: a da Comissão de Jovens do Polo da Borborema, assessorada pela AS-PTA, na Paraíba; a da rede de jovens e agroecologia assessorada pelo Centro Sabiá, em Pernambuco e a experiência de jovens com a assessoria do Centro de Tecnologia Alternativa (CTA), na Zona da Mata Mineira. Os jovens do Polo da Borborema apresentaram o contexto de surgimento do trabalho com a juventude na região, que tem suas raízes em 2002, quando nasce o trabalho da “Campanha de Fortalecimento da Vida na Agricultura Familiar” que passou a trabalhar com os filhos e filhas de agricultores envolvidos na dinâmica de atuação do Polo e da AS-PTA. A Campanha promove os chamados “mutirões”, atividades lúdicas nas comunidades, em parceria com as escolas, onde a cada semestre um tema é trabalhado com as crianças de 3 a 11 anos, valorizando o seu saber e o local onde vivem.

“Essas crianças foram crescendo e já não queriam mais participar dos mutirões. Foi aí que foi surgindo a necessidade de se ter um espaço só com os jovens. Em 2010, realizamos o I Encontro da Juventude Camponesa. Em 2013, o Projeto Sementes do Saber (apoiado pelo CCFD e co-financiado pela União Europeia) veio fortalecer e apoiar as experiências que os jovens já estavam desenvolvendo, como os fundos rotativos solidários”, disse Márcia Araújo, do município de Lagoa Seca e da Comissão Executiva de Jovens do Polo da Borborema.

Os jovens Mônica Lourenço, de 19 anos, do Assentamento Caiana, em Massaranduba-PB e Alan Kilson Fernandes, de 21 anos, do Assentamento Oziel Pereira em Remígio-PB, apresentaram os resultados do diagnóstico realizado com a juventude do Polo da Borborema em 2015. O diagnóstico partiu das perguntas orientadoras: “Por que os jovens decidem permanecer ou sair da agricultura?”, “Como esses jovens veem a agricultura?” e “Quais desafios eles enfrentam?”. “O mais legal desse diagnóstico é que foram os próprios jovens que fizeram, com o apoio da assessoria. A gente não queria que fosse uma entrevista, que os jovens se sentissem pressionados. Foi muito mais uma conversa, um bate papo entre jovens”, afirmou Alan.

O diagnóstico da juventude do Polo da Borborema contou com o apoio da entidade de cooperação suíça terre des hommes e buscou entender a juventude, identificar suas problemáticas, construir estratégias de ação e envolver mais jovens, no sentido de fortalecer a auto-organização e reafirmar a sua identidade. O resultado do diagnóstico indicou o acesso à terra e aos recursos naturais, a participação dos jovens, a educação do campo, o machismo, a homofobia, o preconceito, o incentivo dos pais, a influência da mídia, as políticas públicas, a geração de renda e a violência no campo, como pontos que determinam, ou não, a permanência dos jovens na agricultura.

“Quando a gente começou o trabalho, a gente tinha ideia de que o machismo era muito forte, mas não tínhamos noção de que iriamos encontrar uma jovem de 16 anos, por exemplo, que não poderia trabalhar na terra de seus pais, porque aquela terra seria herdada por seu irmão homem de 9 anos”, comenta Mônica Lourenço. “No nosso encontrão da juventude conseguimos fazer a devolução do estudo e trabalhar algumas dessas questões, como a homofobia, onde usamos o teatro, de uma forma humorística, mas com muita seriedade. O resultado do nosso diagnóstico foi sistematizado em um vídeo que ficou lindo, e inclusive, me emocionou muito”, completou.

Por fim, os três jovens apresentaram os desdobramentos do diagnóstico, que provocou um processo de articulação e mobilização da juventude no território que culminou com a realização de duas feiras agroecológicas e culturais da juventude camponesa e da I Marcha da Juventude Camponesa, que reuniu, no município de Remígio-PB, mais de 1.000 jovens, que foram às ruas para dar visibilidade ao seu trabalho e as suas experiências, assim como para denunciar os obstáculos à sua permanência no campo.

A programação do dia foi encerrada com uma análise de conjuntura que contou com a facilitação da antropóloga e professora dos Programas de Pós-Graduação em Ciências Sociais e em Desenvolvimento, Agricultura e Sociedade da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ) Elisa Guaraná de Castro, autora do livro “Entre ficar e sair – uma etnografia social da categoria juventude rural”.

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A manhã do segundo dia de encontro foi dedicada à realização de rodas de diálogo sobre temas como diversidade sexual, gênero, educação do campo, cultura, comunicação e comercialização, entre outros. Após a socialização das rodas de diálogo, Eugênio Ferrari, professor de Licenciatura em Educação do Campo da Universidade Federal de Viçosa (UFV), de Minas Gerais, falou sobre a força e a contribuição da juventude na construção da agroecologia e da própria ANA: “As pessoas às vezes perguntam ‘e quem é essa dona ANA?’ e eu gosto de responder: ‘a ANA somos nós, nossa força e nossa voz’, assim como a gente dizia com a UNE (União Nacional dos Estudantes) no passado. Porque a ANA só existe porque existem lá nas nossas regiões, os nossos grupos, nas nossas comunidades, as redes. Sem isso, ela não existiria. A juventude está aí dando aulas de cidadania e eu acho que assim como o GT de Mulheres conseguiu, a partir da sua ação, ter uma intervenção, essa garotada tem tudo para avançar nesse trabalho de luta em defesa do projeto da agroecologia”, afirmou Ferrari.

À tarde foram feitas vivências culturais por meio de visitas a pontos turísticos da cidade como o Paço do Frevo e o Museu Cais do Sertão, próximos ao Marco Zero, de onde, no fim do dia foi organizado um cortejo e um ato político e cultural contra os retrocessos aos direitos conquistados pela juventude impostos pelo Governo Federal atual como a proposta de reformulação do ensino médio e a Proposta de Emenda à Constituição 241, aprovada na Câmara e em tramitação no Senado (PEC 55), que congela investimentos na saúde a na educação por 20 anos. O cortejo culminou com um ato cultural na Praça do Arsenal, no Recife antigo, onde se apresentaram jovens artistas e o grupo de dança e percussão pernambucano “Pé no Chão”.

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O terceiro e último dia de encontro foi de discussão em grupos por regiões e/ou estados para o debate acerca das estratégias para o fortalecimento da juventude do movimento agroecológico e dos encaminhamentos, como a indicação da criação de um Grupo de Trabalho de Juventude da Articulação Nacional de Agroecologia. Foram escolhidos dois nomes (de uma moça e de um rapaz) para representar cada região no GT de Juventude, que já tem como tarefas a articulação para a participação de jovens no Congresso Brasileiro de Agroecologia em 2017 e no IV Encontro Nacional de Agroecologia, em 2018. Para o estado da Paraíba, foram levantadas estratégias como: a organização de novos grupos de jovens nas comunidades; organizar seminários para debater a conjuntura política com jovens; buscar a articulação com jovens urbanos; fortalecer os fundos rotativos solidários de jovens; fortalecer a participação dos jovens nos sindicatos, nos partidos políticos, conselhos municipais, redes e fóruns territoriais; propor a discussão sobre as várias formas de violência que afetam os jovens, entre outras. A primeira reunião do GT de juventude da ANA ficou marcada para os dias 14 e 15 de fevereiro de 2017, em Recife.

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